10 de dez. de 2008

Silêncio da pia

Olhos grudados da sujeira de ontem.Não lembro que dia foi ontem.Não sei que dia é hoje. Tudo isso pouco importa. Aos poucos a escuridão vai tomando forma. As luzes dos carros que passam pela avenida atravessam a janela e projetam-se rápidas no teto de madeira envernizada. Perco alguns minutos olhando. Ajeito-me um pouco entre o lençol e o colchão. Ajeito calmo a cabeça que pesa em mim, que pesa no travesseiro que pesa na cama que pesa no chão. O barulho dos carros não mais me incomoda. As luzes me agradam. Trago minhas mãos aos olhos e perco minha cabeça em pensamento, que, com muito esforço, eles não passam de sombras. Isso dói. Respiro fundo sentido o ar entrar pelo nariz, inflar a barriga depois o tórax até erguer meus ombros, depois, solto bem de-va-gar fazendo o caminho inverso. Assim como um ritual. Duas, três, quatro vezes. Levanto-me lento e sento aliviado na cama. Olho pro chão e conto os tacos quebrados. Acendo um cigarro e trago fundo sentido o ar entrar pelo nariz, inflar a barriga depois o tórax até erguer meus ombros, depois solto bem de-va-gar fazendo o caminho inverso. Assim como um ritual. Sinto a cabeça estranha como se um tubo de ar entrasse por um lado de minha cabeça saisse pelo outro e voltasse a entrar, assim, entrando, entrando, entrando, saindo, saindo, saindo, voltando, voltando, voltando, rodando, rodando, rodando. Na boca o gosto de ontem: das bebidas baratas, dos tabacos fortes, dos outros, das outras, das conversas tolas... Tudo parece misturado aqui dentro de minha cabeça. Dou mais uma tragada e ando em direção a porta. Meus pés estralam, minha cabeça flutua. um vento frio bate em minhas costas e arrepia cada pêlo da minha pele nua e de carne crua. Passo pela sala que está amarelada por causa da luz da rua que pula a janela e contorna os móveis. Telefone fora do gancho, tevê sim sinal, roupa amassada sobre a poltrona. Da vitrola notas, timbres e palavras dançam lentas nessa atmosfera densa e amarela. No banheiro encho a pia com água, ajeito o cabelo com as mãos e olho fixo no olho do espelho. Respiro o mais lento que consigo. Fecho os olhos, umideço os lábios, prendo a respiração e mergulho o rosto no silêncio daquela pia com água fria. Tudo Silêncio. E dentro desse silêncio eu grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito, grito...

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